Religiões adoram se associar a bondade. No "Espiritismo" brasileiro, totalmente deturpado, não é diferente. Mas algo contido na versão deturpada da doutrina que pões em cheque essa "vocação" pela bondade: a terrível Teologia do Sofrimento.
Surgida na era medieval, mas esquematizada e difundida por Teresa de Lisieux, a Teologia do Sofrimento sugere que a dor é o caminho para a evolução. Não a luta para eliminar a dor, o que seria lógico, mas a dor em si. Ficar se contorcendo no chão gemendo de dor, para os entusiastas dessa ideologia é um "privilégio".
É uma ideologia cruel, mas que atrai muitos adeptos - entre os não-sofredores, é claro! - pois os dispensa de ajudar as pessoas, o que exigiria esforço, custos e abnegação. Legal. É deixar o miserável no "privilégio" de sua desgraça e acreditar que ele está na "dianteira" da evolução, só porque geme sem parar.
Dois ícones que infelizmente foram consagrados como sinônimos de bondade máxima, mas que na verdade eram dois picaretas mal-intencionados, Madre Teresa de Calcutá e Francisco "Chico" Cândido Xavier eram entusiastas e difusores do ato infeliz de transformar desgraça em salvação, algo que não faz o menor sentido lógico. Mas religiões nunca trabalham com a lógica.
Essa teologia se baseia na interpretação errada da condenação de Jesus que supostamente teria "se oferecido" para ser pregado na cruz para "salvar a humanidade", o que desafia qualquer tipo de lógica. Se esquecem os religiosos que Jesus foi morto por motivos políticos, pois era ativista e seu discurso ameaçava o poder dominante na época.
Mas fatos nunca são lindos. Lindos são contos de fadas e estórias sem pé nem cabeça. Lindo é Jesus sendo condenado para "salvar a humanidade" e ressuscitar depois (ué, ele desistiu de "salvar a humanidade"?). É ilógico, mas comove.
E com isso, algumas correntes do Catolicismo abraçaram esta teologia que é sádica para as lideranças e masoquista para os fiéis menos afortunados, fazendo com que sofrer seja algo admirável, mas ao mesmo tempo útil, por dispensar muitos de lutar pela melhoria da sociedade, já que estando presa na desgraça, ela "vai alcançar os céus".
É uma teologia bem safada, pior que a pornografia mais chula. O "Espiritismo" brasileiro a abraçou por causa do prestígio dado ao médium Chico Xavier, considerado por muitos a maior liderança do que Herculano Pires chamou sabiamente de Seita de Papalvos. Xavier acreditava na Teologia do Sofrimento e seus seguidores acharam conveniente enxertá-lo no "Espiritismo" brasileiro.
A dor, na verdade não salva ninguém. É uma falácia defender a Teologia do Sofrimento. O que salva é a tentativa de eliminar o sofrimento, pela coragem, pelo esforço e pela criatividade. Propor soluções é algo ainda pouco praticado no Brasil por casa da forte influência cristã, que para muitos significa a manutenção da Teologia do Sofrimento. Sem soluções, problemas são mantidos e na prática, ninguém se salva.
O "Espiritismo" adaptou a teologia afirmando ser ela resultado de "más atitudes" em vidas passadas (pecado original "espírita") e que a felicidade está reservada apenas em uma reencarnação posterior, quando o contexto e a identidade do espírito que sofre no tempo presente forem completamente diferentes, havendo o risco da tal "prosperidade" nunca mais chegar. Catolicismo medieval puro e legítimo, adaptado para ser aceito por uma versão irresponsável da doutrina que nunca concordou com os católicos.
E é triste saber que uma doutrina que nasceu para ser lógica e salvadora tenha incorporado com estranha satisfação a Teologia do Sofrimento. Essa teologia é o oposto da bondade alegada e a sua adoção mostra que muitas lideranças "espíritas" são bem sádicas, se beneficiando do mal estar alheio, encontrando na citada teologia a oportunidade se se livrar da culpa pelo sadismo.